2 de Maio de 2024
Processo de liquidação das Associações de Classe (DL 23.050 de 23 de setembro de 1933)
1933-12-24 – 1934-01-24
Expediente do Governo Civil do Distrito de Santarém para cumprimento de circular n.º 1.861 sobre liquidação das associações de classe que não acataram as disposições do Decreto-Lei n.º 23.050 de 23 de setembro de 1933.
Contém os documentos: Circular n.º 1861 do Ministério do Interior (1933-12-24); Ofício de João Ferreira Marques, administrador do concelho de Rio Maior (1934-01-09); Ofício de Luís Belo, administrador do concelho de Mação (1934-01-10); Ofício de João da Silva Louro, administrador do concelho de Alcanena (1934-01-10); Ofício do administrador do concelho de Almeirim (1934-01-10); Ofício de Eugénio Santos, administrador do concelho da Chamusca (1934-01-11); Ofício de João da Costa Andrade, administrador do concelho de Abrantes (1934-01-12); Ofício do administrador do concelho de Salvaterra de Magos (1934-01-12); Ofício do administrador do concelho de Alpiarça (1934-01-13); Ofício de António Terreiro, administrador do concelho de Golegã (1934-01-13); Ofício de Luciano Godinho Cabral, administrador do concelho de Ferreira do Zêzere (1934-01-15); Ofício de Francisco de Lemos Júnior, administrador do concelho de Vila Nova de Ourém (1934-01-24).
PT/ADSTR/GCSTR/E/B– Portugal, Arquivo Distrital de Santarém, Governo Civil de Santarém (em tratamento arquivístico).
Assinalamos o 135.º aniversário da declaração do dia 1 de maio como Dia do Trabalhador, pela Segunda Internacional, reunida em Paris em 1889, em memória da greve geral de Chicago de 1886, para reivindicação das oito horas de trabalho, conhecida como Revolta de Haymarket.
- AS ASSOCIAÇÕES DE CLASSE EM PORTUGAL
Em Portugal, as associações de classe remontam ao século XIX. A extinção das corporações de ofícios em 1834 impulsionou a criação de novas formas de organização profissional.
Nos finais do século XIX assistiu-se a uma multiplicação das organizações de trabalhadores que, até à publicação do decreto que legalizou o associativismo laboral, centravam os seus propósitos nas áreas do mutualismo e da beneficência.
Atualmente designadas sindicatos profissionais, as associações de classe tiveram a sua organização e funcionamento regimentados pelo decreto de 9 de maio de 1891. No diploma publicado pela Direcção Geral do Comércio e Indústria a justificação para regular tais associações encontra expressão no art.º 282.º do código penal que proibia “associações de mais de vinte pessoas, que não tenham sido previamente auctorizadas com as condições que o governo julgar convenientes”.
Assim, face à multiplicação de associações de comerciantes, industriais, agricultores, empregados e operários “sob a denominação genérica de associações de classe foram compreendidas no projeto de decreto as sociedades compostas de mais de vinte indivíduos, da mesma profissão ou de profissões correlativas, tendo por fim o estudo e a defesa dos interesses profissionais (…) comuns, abrangendo assim as associações comerciais, industriais ou agrícolas, quer sejam compostas só de patrões (comerciantes, industriaes ou lavradores), só de empregados, operários ou trabalhadores rurais, ou mixtas”.
- O DECRETO- LEI 23.050 DE 23 DE SETEMBRO DE 1933 NO ÂMBITO DO SISTEMA CORPORATIVO DO ESTADO NOVO
O Decreto-Lei n.º 23.050, de 23 de setembro de 1933, que aprovou o Estatuto dos Sindicatos Nacionais, insere-se nos princípios consagrados pelo dispositivo legal do sistema corporativo do Estado Novo. O essencial desta legislação compreendia o Estatuto do Trabalho Nacional (ETN), que reproduz a Constituição de 1933 («Ordem Económica e Social»), o Decreto-Lei 23.049 (grémios), o Decreto-Lei 23.050 (sindicatos nacionais), o Decreto-Lei 23.051 (casas do povo), o Decreto-Lei 23.052 (casas económicas) e o Decreto-Lei 23.053 (Instituto Nacional do Trabalho e Previdência).
Os sindicatos nacionais foram definidos como agrupamentos de mais de cem indivíduos da mesma profissão, destinados ao estudo e à defesa dos interesses profissionais nos aspetos moral, económico e social, formados por indivíduos que trabalhavam por conta de outrem ou exerciam profissões livres.
Previa um conjunto de mecanismos de intervenção na vida sindical a que o Governo poderia recorrer, designadamente controlar a realização das reuniões de direção e das assembleias sindicais e daquilo que aí se poderia discutir, controlar as eleições e os dirigentes sindicais eleitos, censurar tudo o que se passasse na vida sindical que o Governo entendesse ser subversivo, a homologação e o direito de dissolução administrativa dos sindicatos.
A liquidação das associações de classe foi um procedimento que derivou de todo este corpus legislativo, designadamente o consagrado no art. 8.º: “Os sindicatos nacionais só se consideram constituídos e têm existência legal depois da aprovação dos estatutos dada pelo Sub-Secretariado das Corporações e Previdência Social, ficando diretamente dependentes do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência e sujeitos, no que respeita à ordem pública, às autoridades administrativas”.
- A LIQUIDAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES DE CLASSE NO DISTRITO DE SANTARÉM
O expediente para a aplicação da liquidação das associações de classe não apresentou delongas.
Apenas decorridos três meses da sua aprovação, Armando Vitorino Ribeiro, chefe de gabinete do Ministro do Interior Antonino Gomes Pereira, oficia, por circular confidencial e urgente, José Garcez Pereira Caldas, governador civil do Distrito de Santarém, a remeter despacho do Sub-Secretário de Estado das Corporações e Previdência Social “sobre a liquidação das associações de classe que não acataram as disposições do decreto-lei n.º 23.050 ou às quais não foi consentido submeter-se à organização corporativa nacional”.
O governador civil colocou a sua máquina administrativa ao serviço da tutela e o resultado da consulta aos administradores do concelho encontra-se resumido no quadro que se apresenta:
Os dados recolhidos são apresentados no gráfico de funil seguinte:
Quadro – Síntese das respostas tipo dos administradores do concelho do distrito de Santarém sobre a liquidação das associações de classe
Destacamos a resposta do capitão João da Costa Andrade, administrador do concelho de Abrantes, que informa terem sido “depositadas n’esta repartição os alvarás, estatutos e livros pertencentes às Associações dissolvidas nos termos do decreto 23050, respetivamente Associação de Classe dos Manufatores do Calçado, Associação de Classe dos Trabalhadores na Industria de Construção Civil, Associação de Classe dos Trabalhadores na Industria de Metaes, a Associação de Classe dos Operarios de Construção Civil, e Associação de Classe dos Empregados do Comercio e Industria.”
E continua referindo que “como nenhuma d’estas Associações possue quaesquer moveis ou artigos para liquidar, é pois desnecessaria a indicação dos delegados a que se refere o §1.º do art.º 24 do citado decreto, visto não haver partilha a fazer aos mesmos bens.”
Bibliografia:
ALCÂNTARA, Ana – Associações de classe e operariado na Lisboa do final do século XIX. In CABREIRA, Pamela Peres, org. – História do Movimento Operário e Conflitos Sociais em Portugal: Congresso História do Trabalho, do Movimento Operário. Lisboa: Instituto de História Contemporânea, 2020, p. 23-47. Disponível em https://comum.rcaap.pt/handle/10400.26/37708.
LUCENA, Manuel – A Evolução do Sistema Corporativo Português. Volume I – O Salazarismo. Lisboa: Teoria Política. Perspectivas & Realidades, 1976.
MARQUES, Helder Miguel – O movimento sindical durante o Estado Novo: estado actual da investigação. História. Revista da Faculdade de Letras. Porto. 8 (2007) 299-316. Disponível em https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/3359.pdf
Fundos relacionados:
PT/ADSTR/AC/JCCP – Arquivo Distrital de Santarém, Junta Central das Casas do Povo – Distrito de Santarém
PT/TT/ACL – Torre do Tombo, Associações de Classe
PT/TT/AOS/D-B -Torre do Tombo, Arquivo Oliveira Salazar, Correspondência Oficial, Corporações
PT/AMBNV/AMB – Arquivo do Município de Benavente, Associação dos Marítimos de Benavente
PT/AMABT/ANCA – Arquivo do Município de Abrantes, Associação dos Manufatores de Calçado de Abrantes
PT/AMABT/ATCC – Arquivo do Município de Abrantes, Associação de Trabalhadores da Construção Civil
PT/AMABT/ATIM – Arquivo do Município de Abrantes, Associação de Trabalhadores da Indústria dos Metais
PT/AMTNV/MOL – Arquivo do Município de Torres Novas, Montepio Operário das Lapas (contém documentação da Associação de Classes Trabalhadoras das Lapas que o antecedeu)
Nota: Os códigos de referência apresentados para os fundos pertencentes a Arquivos Municipais foram produzidos por nós.